quarta-feira, 19 de maio de 2010

Se há uma beleza maior que a paixão, é o espanto. Com uma frase destas, o leitor, se é que o tenho, é capaz de cuspir nestas linhas, com uma veemência feroz e desentendida. Porque quando falo da paixão, falo do espectral, da raridade estendida, mas ainda assim compreensível, e vejo no leitor, no seu olhar de adolescente, uma nostalgia adorável, como uma velha canção em seu ouvido judiado. Mas quando falo do espanto, não. Porque o espanto não sugere o medo por seu nome vilão, mas amedronta pelo desconhecido. Eis a abjeção mais nobre de meu leitor ao espanto. Admito, revelei-o precocemente. Paciência. Guardo o espanto para as linhas derradeiras, subjugo seu poder num lirismo que eu mesmo manipulo, sem escrúpulos, mas não posso impedi-lo de saltar, agora, como um moleque, e atirar, enfim, como um senhor de si mesmo. Repito: a única beleza maior que a paixão é o espanto.
O sujeito apaixonado é um fenômeno irreparável. É como o sujeito convertido. Porque faço da paixão, sim, a religião. Por fim, do sujeito apaixonado não há muito que se dizer. É um fenômeno quase sempre homicida, nas suas peculiaridades cinematográficas, um devaneio quase pensado, esta é a paixão, desmedida e desaconselhada. Mas o sujeito que segue às ruas, no seu firmamento indestrutível, está a um passo do espanto. O sujeito espantado desfigura-se com ardor, não duvido que abandone os princípios, a família, o que for. É como ver-se enfermo de uma doença rara. Rara porque hoje não nos espantamos mais. O espanto é, para nós, como uma volta horrenda a um passado arcaico e indesejável. Hoje, na nossa modernidade egoísta, esquecemos de nos espantar. Entendo o desespero dos espantados. Não há um grande gesto que, hoje, espante. Uma grande obra, um grande dia, um grande ser humano morto. Posto que o verdadeiro espanto esteja nas pequenas coisas. Do tempo em que trair, seja aos outros, ou às suas palavras, espantava um povo que ecoava por anos. Hoje, a traição individual ou coletiva, é uma moda de primeira. Nós, na nossa cretinice geral, estamos diante de um homem que não fraqueja ao se trair, não chora ao matar, não pondera ao degradar. Que somos nós diante da traição, da morte, ou da humilhação? Um belo e unido dar de ombros. O espanto é o rebaixamento de nossos valores de plástico. Nada haverá de espantar, por muitos anos.
Direi pela última vez, como um pregador incansável: se há uma beleza maior que a paixão, é o espanto. Posto que o apaixonado encontre, mesmo raro, um coração que bate por ele; e o espantado, somente olhos de desprezo.

Um comentário:

  1. Filho da puta!
    sahashuas
    "Se há beleza maior que a paixão, é o espanto!" sacada da porra andré.. sahuashuashuas
    vou roubar essa frase..
    ei.. melhor texto teu que li.. até agora.. hasush

    ResponderExcluir