segunda-feira, 21 de junho de 2010

Felizmente, não há palavra para tudo. Porque, se houvesse, saberíamos no primeiro instante em que tocássemos o outro e sentíssemos nós mesmos, que a grande rota dos nossos dias se desenharia silenciosa, e percorreríamos em busca do instante em que, insatisfeitos, perceberíamos que mais valia ter dito o que nos foi proibido, que ter vacilado desajeitadamente. Por bem, nos custa saber que continuaremos vacilando, e que as palavras insistem em nos seduzir com o deleite do recanto, com a sabedoria da timidez. As palavras se fingem ingênuas e incapazes de nos revelar, e eis seu brilho incontestável, porque vejo sua gentileza profunda, concebendo a imponência de todos os sentimentos, e permitindo a si mesmo sequer tentar desvendá-los. Palavras são umas poucas crianças que tentamos nos apoiar para nos tornarmos, enfim, adultos. Como criaturas respeitosas, compreendem a sabedoria de todos os sentimentos que nos cercam, a cada vã tentativa de desvendar suas faces. Tento reduzir as palavras, mas elas não se atrevem a reduzir os sentimentos, as sensações percorridas, os anseios puros e atravessados; sabem que certas coisas são intocáveis. As palavras e seus imortais cantadores; vejo todos juntos, discutindo com bondade o quanto falharam, o quanto arderam nos pormenores dos versos, mas tanto que foram cercados por tudo o quiseram dizer, e não conseguiram. É por terem sabido tratá-las como as mais valiosas mulheres, que são grandes, mas é pela delicadeza de terem silenciado quando notaram a maneira singular de cada uma, que são imortais.
Estes dias pedem vigor suficiente para, como as palavras, compreender sentimentos indizíveis, vê-los chegando assim subitamente, contradizer-se de forma natural, aceitá-los muito amiúde, e como as meninas indomáveis, cerrar os olhos e compreender que estas presenças não nos forçam a morte, mas nos incentivam à vida. E, não apenas esses dias, abrigar o infinito ofício de caçar as palavras de maneira incansável, afinal, é isto que fazemos nós, seus dependentes.

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